Recentemente presenciamos através da mídia, um enterro incomum. Ao invés de silêncio e choro, bateria de escola de samba e aplausos. Foi assim que a comediante mais polêmica que o Brasil já teve, nascida Dolores e conhecida como Dercy Gonçalves despediu-se de seus fãs e simpatizantes. Curiosamente no ano de 2008 perdemos também a antropóloga Ruth Cardoso que a maioria dos brasileiros aprendeu a chamar de primeira-dama, título que a professora universitária repudiava. Hillary Clinton perdeu a corrida por uma vaga no partido democrata para disputar as eleições presidenciais, Ingrid Betancourt foi libertada pelas FARC e Aleida Guevara esteve em Cascavel para proferir palestra sobre o legado de seu pai, revolucionário sonhador para alguns, terrorista militante para outros. A Argentina agoniza em sua crise interna, cuja protagonista, Cristina Kirchner, poderia muito bem entoar em família o hino Don’t cry for me Argentina sem temer qualquer crítica: fez por merecer a derrota sofrida no senado. Em Cascavel, uma única mulher disputa a corrida ao paço municipal. O que estas mulheres têm em comum para ganhar as páginas dos jornais e ocuparem espaço na mídia? Em algum momento de suas vidas, elas arriscaram. Errando ou acertando, saíram da posição de esposa, mãe, profissional e partiram em busca de um sonho acalentado talvez na infância, ou aflorado por qualquer circunstância que o valha. Estão tentando. E digo, com absoluta convicção, que é muito mais cômodo e seguro (por que não dizer?) limitar-se ao exercício de nosso trabalho – apreendido nos bancos escolares ou na escola da vida – e às atividades de casa do que adentrar no universo masculino e posicionar-se junto (ou contra) àqueles que fizeram da política e dos outros setores, um ambiente eminentemente masculino. E não torçam o nariz argumentando que as mulheres têm direitos iguais e que entram nessa por oba oba. É a forma de comprovar o descaso com que tratam as mulheres no Brasil. Seria cansativo lembrar o escasso número de mulheres que fazem parte do congresso nacional ou que lideram empresas no país. E a história das cotas dos partidos? Pura chacota. Poucas arriscam. É chato demais agüentar as piadinhas e o desprezo masculino. Bacana mesmo é presenciar o discurso de muito marmanjo por aí: “... as mulheres conquistaram seu espaço e fizeram por merecer”. “...eu voto em mulher. Elas têm o condão de mudar o mundo”. Depois que tiram o microfone da cara e encontram outro do mesmo gênero, soltam a primeira piadinha que lhes vêm à cabeça. É assim que funciona. Mas quero registrar a tentativa, a luta aguerrida e ousada de muitas que desafiam o poderio que impera por aí, lutando contra o preconceito arraigado em nossa cultura. Dizem por aí que há uma pesquisa que comprova que a mulher é incorruptível ou menos que o homem. Sinceramente, creio não ser prerrogativa do gênero feminino e sim de caráter. E caráter é invariável. Independe de gênero. Mas comecei essa prosa falando em Dercy Gonçalves e na saudade que terei de ver sua irreverência escrachada e a autonomia de falar o que bem quisesse que a experiência dos anos lhe conferia. Tributo à ousadia de Dercy, que certamente soltaria um “que p&#*a é essa?” se pudesse ler este artigo. Poucos vivem mais de um século sem rabo preso com ninguém. Ela conseguiu. Mas o importante mesmo é tentar. Arrisque-se mulherada!
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